quarta-feira, 1 de julho de 2009

Instante

Quando você parou e deixou no ar a possibilidade de voltar, eu senti seu coração disparar e a sua respiração acelerar como se fosse o meu corpo que reagisse ao frenesi da cidade. Foram dez segundos em que o sinal da avenida se abriu e os carros aceleram rumo às suas rotinas; bem naquele instante uma onda destruiu o castelo de areia que duas irmãs construíam à beira-mar; e um mendigo no outro lado da rua era ignorado por mais um transeunte. Os segundos explodiram no meu relógio, mas o tempo não parou. Você seguiu, sem olhar para trás.

Fiquei parado no meio da calçada, primeiro triste, depois atônito. Senti-me consumido pela brisa seca que corria por entre os esqueletos cinzas e desejei intensamente ser levado para algum tipo de céu onde eu pudesse deitar - não por estar cansado, e sim pela necessidade de reencontrar sentido em ter os pés no chão. Abruptamente, era preciso aprender o básico. Ironicamente, esvaiu-se na ampulheta a certeza que eu carregava e, por mais que eu pensasse em me esforçar para catar os grãos, sabia que de nada adiantaria.

Eu quis, mas não veio céu. Tampouco o inferno. A realidade permaneceu como seus passos haviam deixado para trás. Busquei todas as imagens e sons da nossa conversa, mas só o que sobrou foi o silêncio, porque nada houve além disso. Eu, completamente vazio entre as notícias de ontem das manchetes de jornal e o passeio dos velhos. Fazendo o mesmo roteiro de sempre, como uma tentativa de reconstruir aquele pedaço da vida que se perdeu e não sabemos muito bem o motivo.

Não caiu a noite, nem se fez dia. Eu estava ali, desde sempre, contudo sem chegar ao lugar que eu queria. Tentei buscar no ar um cheiro bom de nós dois, qual!, nunca fomos nada disso e os odores de terça-feira eram somente uma mistura de sujeira e mau gosto. Não havia saída para isto que parecia desde o início um jogo. Eu desconfiei, só que entrei sem querer encontrar qualquer saída. Sei que estou preso, sei que estou só, mas continuo sem saber se quero sair.

Eu vi todo o trajeto que você fez depois de sumir por aquela esquina. Passou por todas as minhas veias, suave e quente, qual meu próprio sangue. Eu senti! Atravessou lentamente cada rua em um ritmo constante, sem sobressaltos, sem olhar para trás nem piscar. Não veio a chuva redentora, nem mesmo um afago do destino. O som externo foi diminuindo e logo também deixei de ouvir meus pensamentos. Pisquei os olhos e já não havia mais diferença. Não havia mais.

C.C.J.

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