quarta-feira, 15 de julho de 2009

O mundo é dos oportunistas


A reunião vara a madrugada. Coronel Sarney testa a resistência de seus parlamentares, todos eles fragilizados pelo efeito do whisky 12 anos. Sentado à cabeceira da mesa de reuniões, o maranhense começa a falar. Um homem inquieto pergunta a si mesmo porque tornar público o cancelamento de atos antes secretos. "Oportunismo, substantivo derivado do irmão gramatical oportunidade. Do latim opportunitate, opportunity em inglês, oportunidad em espanhol, oportunilopos em grego, oportunilikov em russo. Em tupiniquim, a boa e velha malandragem", disse o bigodudo. O oportunismo é faca de dois gumes e duas caras, a cara-de-pau e a cara mal-lavada. É atributo necessário a todos, especialmente ao brasileiro. Quem nasce por aqui possui alguns sentidos notoriamente aguçados. O senso musical, o senso futebolístico, o senso de humor, o senso da falta de bom senso e também o senso de oportunidade.


Não existe nada mais oportunista do que elogiar Roberto Carlos nesta maré de festividades. De repente, de uma hora para outra, todos se tornaram fãs do Rei, este sim o Michael Jackson brasileiro. O cantor, grisalho desde os tempos em que carregava uma planta na orelha e defendia a Amazônia (qual foi o oportunista que não homenageou a floresta no início dos anos 90?), trocou o rock pelo refrão brega da mesma forma que o falecido trocou a pele negra pela branca: lentamente. Poucos se lembram, mas não faz muito tempo, o Rei ficou deprimido, exagerou nas excentricidades, criou um mundo monocromático próprio, e por pouco não apareceu nas ruas da Urca com o rosto coberto por máscaras antigripe suína. Naquela época, dizem, ninguém queria aparecer ao lado de Roberto Carlos além de Lady Laura. Nos duetos, apenas o Blue Man Group tinha espaço em seu estúdio particular.


O boato não passa de grande injustiça, é bem verdade. Erasmo Carlos, o “Tremendão”, tremendo coadjuvante desde os tempos em que Wanderléia era sinônimo de beleza, nunca abandonou o velho amigo famoso e oportunista. Recentemente, o cantor lançou álbum de rock, segundo ele, capaz de cativar pessoas de todas as idades. Desta vez, o senso de oportunidade foi deixado de lado. Erasmo perdeu ótima oportunidade de ficar calado.


O oportunismo, dependendo da circunstância, pode ser vital. Outro dia, três seguranças armados tiveram ótimo senso de oportunidade, oportunidade de livrarem a própria pele em detrimento de um punhado de dinheiro a ser roubado dos cofres do terceiro maior conglomerado bancário do Brasil. Por outro lado, um homem de posse de um velho revólver calibre 38 optou por desafiar seis bandidos com metralhadoras nas mãos e ideias homicidas na cabeça. O homem armado, vigilante do bairro, teve ótimo senso de oportunidade, oportunidade de fazer uma cagada do tamanho da tragédia confirmada logo depois.


Outro exemplo de oportunismo é o fenômeno decorrente da Operação Lei Seca. Todos querem tirar uma casquinha da ótima iniciativa de livrar o trânsito dos motoristas dotados de senso de oportunidade, oportunidade de encherem a cara e provocarem mortes ao volante. Ônibus que perambulam pela madrugada sofrem vinte assaltos por parada e ainda pedem aos alcoolizados que voltem para casa após pagarem R$ 2,20. Quem bebe chega em casa vivo e pelado. Taxistas fazem o mesmo, oferecem segurança, porém cobram muito mais caro. Novamente, o bêbado chega em casa vivo e pelado. Recentemente, as vans legalizadas parecem ter entrado na onda. O problema é que ninguém nunca viu uma para confirmar. Dizem que no pé da Rocinha já há novos adesivos: Operação Lei Seca: Vá de Mototaxi. No alto, outra campanha: Operação Pó Seco: Vá de Aviãozinho.


Oportunismo é um dom, dizem por aí. Para quem não tem criatividade, então, é um prato cheio. Quer maior exemplo de oportunismo que a presença de José Sarney, Roberto Carlos, Michael Jackson e Lei Seca na mesma crônica? O problema do oportunista é que a malandragem, assim como a mentira, tem sempre a perna curta. Ou será que ninguém percebeu que o certo é irmos a cavalo e não de cavalo?


Bruno Marinho

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